12 abril 2008

Autopsicografia



O poeta é um fingedor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só as que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama o coração.



Fernando Pessoa  in  «Poemas 1908-1935»
Imagem: Fernando Pessoa retratado por Almada Negreiros

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